quinta-feira, 17 de julho de 2008

EDUCAÇÃO TEONÔMICA

EDUCAÇÃO TEONÔMICA
Reflexões para uma Filosofia Cristã da Educação

Prof. Guilherme Carvalho

O autor é Mestre em Teologia pela Faculdade Teológica Batista de São Paulo, e professor na Faculdade Evangélica de Teologia de Belo Horizonte (FATE BH).

Introdução: O Problema da Dialética Heteronomia/Autonomia na Filosofia da Educação

Em sua "Filosofia da Educação", Henrique Nielsen faz logo nas primeiras páginas uma síntese geral das idéias educacionais: "Praticamente todas as doutrinas educacionais – do passado até hoje – já mereceram os mais diversos estudos e análises. Os resultados destes estudos analíticos permitem classificá-las em dois grandes grupos: educação progressista e educação tradicionalista ou conservadora". A educação progressista seria aquela na qual "... o indivíduo é estimulado a ser espontâneo, independente, e, por isso mesmo, criativo." Já a educação tradicionalista, denominada por ele "heterônoma" acredita que "... o educando deve assimilar o conjunto dos bens culturais da humanidade de forma absoluta."

Eu acredito que Nielsen está substancialmente correto, não somente quanto ao campo da educação, mas do pensamento filosófico como um todo. O dilema que ele apresentou é o reflexo de uma dialética mais ampla que permeia a atividade cultural ocidental, como veremos mais adiante: a tensão entre heteronomia (a lei ou o governo de outro) e a autonomia (a lei própria, ou autogoverno).

Os cristãos envolvidos com a educação conhecem bem essa tensão. Somos advertidos de todos os lados contra abordagens conservadoras – o próprio Nielsen apresentada a educação conservadora de forma bastante caricatural, postando-se ao lado das propostas "progressistas". Há um consenso de que o propósito da educação é formar o sujeito autônomo e críticas abundantes são feitas ao "autoritarismo" em sala de aula, bem como ao "conteudismo" dos professores. O aluno é o sujeito de sua educação, dizem. Entretanto, teimosamente pretendemos dar a nossos alunos uma educação cristã!

Como se sabe, as propostas educacionais cristãs são vistas por tal consenso como heteronômicas, tirânicas, opressoras e desinteressantes. E então o educador cristão se vê em dificuldades – para ser "progressista", não poderá inclinar os alunos à fé cristã, nem ensinar-lhes conteúdos morais absolutos. Ele conhece, no entanto, os efeitos prejudiciais das abordagens progressistas em educandos que se tornaram desinteressados, rebeldes e anti-sociais. Sente-se então tentado a rejeitar totalmente as abordagens progressistas, como o construtivismo, e praticar um tradicionalismo total.

O problema se torna particularmente difícil quando os conteúdos são claramente anticristãos. É o caso do professor de ciências cristão, por exemplo, que precisa apresentar a teoria evolucionista, mas a considera inaceitável. Sem entrar no mérito da questão: levar o aluno, a partir dos dogmas cristãos, a rejeitar uma teoria científica, não seria realmente uma forma de limitação do pensamento? Não seria uma prática destrutiva para o impulso investigativo dos alunos? Se isso for verdade – e essa é a crítica muitas vezes lançada contra o ensino cristão – a escola cristã seria uma instituição reacionária, antiintelectual e um prejuízo à vida intelectual e moral do aluno. Seria a epítome da heteronomia.

Eu não acredito, no entanto, que isso seja verdade. Não somente porquê a história nos dá muitos exemplos de como a perspectiva cristã trouxe benefícios para a educação e para a vida intelectual ocidental; a própria interpretação de Nielsen e de muitos outros é fundamentalmente errada em suas pressuposições básicas. O dualismo heteronomia/autonomia na educação é uma expressão da inconsistência própria da cosmovisão ociental, sendo essa, por sua vez, fruto de uma determinada orientação religiosa não cristã.

1. O Nomos e a Cosmovisão Ocidental

1.1.. O Problema do "Nomos"

A pergunta sobre a heteronomia e a autonomia é em primeiro lugar a pergunta sobre a fundação dos universais da realidade, e em segundo lugar, a pergunta sobre como o sujeito humano reconhece esses universais. O problema da relação entre os universais e os particulares é um dos problemas mais fundamentais da filosofia, encontrando expressão em todo tipo de formulação das questões teóricas, da arte à ciência, passando pela educação.

O problema dos universais e particulares pode ser descrito como a tensão entre o fato de que temos um sentido de realidades absolutas e imutáveis e por outro lado temos um sentido de realidades mutáveis e passageiras, sujeitas ao devir. O problema é: como nós, sujeitos ao devir, temos também o sentido do imutável? Por exemplo: por quê, apesar de vivermos situações éticas singulares e relativas, sempre temos a impressão de que há valores éticos absolutos que se aplicam a diversas situações?

O problema assume conotações existenciais se perguntamos: sou eu meramente um particular, um produto das condições históricas, absolutamente aprisionado ao devir, ou sou um ser livre, que transcende a história sendo parte dos universais? É óbvio que a resposta a essa pergunta tem amplas implicações espirituais e psicológicas.

Podemos chamar os universais de "nomos". Os universais são as leis que dão sentido à realidade, os absolutos que dão orientação e "forma" à realidade. A presença das leis é o que faz o imutável estar presente a despeito do devir. Mas de onde vêm o nomos da realidade?

1.2. Heteronomia

Uma solução para esse problema foi a identificação de certos aspectos da realidade como a origem do nomos. Isso aconteceu por exemplo no marxismo, que identificou o modo de produção como a base de toda a cultura humana. Assim, nos países que seguiram a teoria marxista, toda atividade humana é reduzida e interpretada a partir das relações econômicas.

Heteronomia significa "lei de outro" (heteros – nomos). Sistemas heteronômicos tendem a tratar o homem como totalmente condicionado pelas leis daquele aspecto preferido da realidade. No caso do marxismo, o homem é um produto histórico e econômico. Assim, o que se vê, é que o sujeito-homem é absorvido pelo objeto-economia. Qual é o efeito da absorção? A desumanização do homem e a tirania. O homem é aprisionado pelas leis econômicas e proibido de pensar e agir tendo outro ponto de partida. Como o estado nesse sistema domina a economia, o indivíduo é tiranizado pelo estado.

Outro exemplo de heteronomia foi a dominação da igreja católica na baixa idade média. Nesse período não se admitiu (embora isso não ocorresse em todos os círculos) que o pensamento científico se desenvolvesse livre das amarras da tradição eclesiástica. Aqui o sujeito é absorvido no objeto-teologia e temos a tirania da igreja (a instituição que lida com o objeto absolutizado).

1.3. Autonomia

Autonomia é a existência com leis próprias, (autos – nomos). Autonomia significa afirmar a liberdade do sujeito contra qualquer lei que não seja intrínseca a ele, e, mas específicamente, que não seja projetada pela própria razão autônoma. A idéia hoje comum nas ciências sociais de que a realidade é uma construção social é uma idéia autonomista. O ideal iluminista de só admitir como verdade aquilo que é justificado pela razão autônoma – o racionalismo – é uma construção autonomista. Todo sistema que não admite a existência de leis absolutas "fora" da consciência do sujeito é um sistema autonomista.

Desse modo, podemos ver que se a idade média representou um período de heteronomia, o racionalismo renascentista propôs uma autonomia. A atual pós-modernidade é a autonomia levada ao extremo: não há verdade absouta, e cada um "constrói" a verdade como quer.

1.4. Sujeito, Objeto e Nomos

As entidades da realidade estão em relação dinâmica, atuando e sofrendo atuação. Assim, uma forma de descrever a realidade é a partir das relações de suas entidades. Um ser que atua é um sujeito, e aquele que recebe a ação é o objeto da atividade do sujeito. Essa divisão simples da realidade nos ajuda bastante a entender o problema do nomos.

Sistemas heterônomos, ao identificar as leis da realidade com um objeto único, tornam o próprio homem um mero objeto associado, e o colocam sob a tirania daquele objeto único, ou da instituição social que lida diretamente com aquele objeto. O erro básico da heteronomia é não reconhecer a transcendência do sujeito e reduzir toda a realidade – inclusive o sujeito – a um objeto.

No outro extremo temos a autonomia. A autonomia surge como uma reação à heteronomia, quando o sujeito não pode mais suportar ser tiranizado e se liberta do objeto reivindicando transcendência em relação a ele – a liberdade. De acordo com a postura autonomista a origem do nomos encontra-se no próprio sujeito, não nos objetos. O sujeito cria as leis, ou projeta de si mesmo de algum modo os universais aplicando-os aos particulares, de modo que sua interpretação da realidade não é a realidade em si, mas sua percepção dela.

2. O Nomos e as Práticas Educacionais na História

Diferentes práticas educacionais tem diferentes orientações nômicas. A educação grega no período arcaico, quando da formação das polis gregas, era extremamente heteronômica, possivelmente devido às condições políticas tumultuadas em toda a região. Em Esparta, por exemplo, a educação era extremamente rígida e militarista, alimentando uma estrutura social classista e tradicional. A partir do século VII a.C. a educação deixa de ser tão militarista, mas continua sendo conservadora e interessada em manter a estrutura social vigente.

É somente quando entramos no período denominado "primeiro sofístico" que a educação grega tradicional é desafiada por uma proposta autonômica. Os filósofos sofistas desprezavam valores atenienses como a ginástica, e introduziram a heurística, um processo de ensino baseado "... no diálogo, no debate e na crítica. Questionando tudo, instauraram a dialética como método." Sócrates, que muitos consideram um tipo singular de sofista, apresentou a maiêutica, um método no qual se conduz o debatedor a encontrar a verdade por si mesmo. Ele foi executado por "corromper a juventude". Um conflito clássico de heteronomia e autonomia.

A proposta educacional de Platão, discípulo de Sócrates, era extremamente heteronômica; em sua concepção a formação dos indivíduos é totalmente controlada por um estado aristocrático. Para ele as histórias que as amas e mães poderiam contar aos filhos seriam determinados pelas autoridades da república, e os governantes do estado democrático seriam educados fora da influência de seus pais, sob a égide do estado; 0 Em reação, a proposta de Aristóteles equilibrava autonomia e heteronomia ao postular ser "... a família a responsável principal pela ação educativa."

O desabamento do império Romano sob o seu próprio peso foi acompanhado de uma crise intelectual e educacional. O longo período de decadência chega ao clímax em 529, com o fechamento por Justiniano da última escola de filosofia existente, em Atenas. Durante a idade média o cristianismo controlou o pensamento e a educação em boa parte do mediterrâneo e na europa, num longo período heteronômico. Com o domínio absoluto da teologia, e as outras ciências foram obrigadas a sujeitar-se. No princípio da baixa idade média surgiu o escolasticismo, que manifestava interesse real pela ciência, praticando um tipo de harmonização da filosofia pagã com o dogma da igreja. Nesse período surgem as primeiras universidades, sob o controle da igreja. A atitude escolástica busca contrabalançar a heteronomia do dogma religioso com uma autonomia relativa na investigação filosófica. Tomás de Aquino introduziu o dualismo natureza/graça para expressar esse balanceamento: a razão pode chegar à verdade sozinha, demonstrando-se assim, por ela, verdades da fé.

A autonomia que Tomás de Aquino concedeu à razão tornou-se o ponto de partida para uma gigantesca reação autonômica à heteronomia medieval. A liberdade dada à filosofia abriu o espaço para a autonomia total da natureza que, na linguagem de Francis Schaeffer, passou a "devorar a graça". É assim que, no humanismo renascentista, encontramos uma autonomia em todos os âmbitos: filosofia, arte, educação, religião, moral – nesse período "Houve um dilúvio de obras pornográficas".

Nesse ambiente ocorre a Reforma Protestante, um movimento de caráter singular. Os reformadores claramente se opunham à heteronomia católico-romana advogando a liberdade de consciência, o livre exame das Escrituras, e estimulando a pesquisa científica. A Academia de Genebra fundada por Calvino é um exemplo eloquente do interesse reformado pela educação. Calvino, especificamente, não admitia que a religião pudesse se limitar às práticas eclesiais. Para ele todas as atividades humanas deveriam ser para a glória de Deus, mesmo que não fossem "sacras". Uma posição nem autonômica, nem heteronômica, mas teonômica. Nesse período surgiu a Didactica Magna de Commenius, que levava a queda em consideração e dava à educação um papel redentivo.

A teonomia reformada durou pouco. O impulso renascentista de autonomia continuou seu curso até o iluminismo, no que significou uma inversão total na inclinação nômica da cultura ocidental. Filosofias educacionais surgidas nesse período tem inclinações autonomistas. É o caso da educação liberal de Locke, Adam Smith e Rousseau. A educação liberal "... opõe-se a toda forma de controle educacional, condena toda forma de ensino baseado em princípios religiosos e políticos." Rousseau, especialmente, ensina que o homem em seu estado natural não é mau nem bom, sendo que toda corrupção é produto da sociedade. A implicação disso é que o educando pode ser visto como potencialmente bom, e que melhor será a sociedade quanto menos fizer imposições sobre o sujeito.

O positivismo prossegue na busca de uma educação livre de todo controle externo; na prática, começa a se constituir num tipo de heteronomia cientificista levantando um grande combate contra a religião e uma tentativa de substituí-a pela "religião da natureza". Seu surgimento revela o caráter paradoxal de toda autonomia: ela acaba se degenerando em uma variedade de heteronomia.

Uma nova etapa importante da inclinação autonômica na educação foi o pragmatismo de John Dewey. Dewey acreditava que o valor de uma idéia estava na sua utilidade prática. Assim a tarefa mais alta da escola não seria a formação de uma certa mentalidade; seria antes a preparação do educando para interagir com a realidade, adquirir seu próprio processo de viver e tornar-se um sujeito criativo. A educação pragmatista é altamente experimental, valorizando a atividade física, a técnica e as questões práticas. Nota-se uma perda do interesse em preservar ou manter qualquer tipo de tradição; a ênfase agora é o sujeito autônomo.

Toda a série de propostas educacionais autonomistas que bebiam do poço liberal encontraram reação no marxismo, uma filosofia profundamente heteronômica nascida em meio à crise da razão moderna no final do século XIX. Em consonância com a diluição do indivíduo na coletividade, própria do marxismo, as concepções educacionais marxistas propunham a persuasão do educando a viver pelos interesses coletivos sacrificando seus interesses individuais. Na doutrina marxista-leninista posterior o estado, que controla os meios de produção em nome dos trabalhadores, torna-se o bem máximo dispondo dos indivíduos e manipulando de forma violentamente opressiva o pensamento e a educação. Marxistas heterodoxos posteriores como Louis Althusser e Gramsci criticaram a escola liberal como um mecanismo de dominação, mas suas propostas educacionais não eram tão heteronômicas.

O século XX viu uma série de propostas autonômicas. Segundo a concepção da Escola Nova, "... a prática escolar deve estar centrada no aluno – pedocentrismo – e não no professor, como na escola tradicional." O aluno é estimulado a rejeitar o pensamento acabado, e o professor a desistir de "ensinar" para criar um ambiente propício à educação. A orientação religiosa deve ser banida do processo educacional. Segundo Henrique Nielsen, as raízes da Escola Nova estão no empirismo, do qual ela recebeu a ênfase nas experiência ao invés do saber intelectual, e no otimismo de Rousseau em relação à natureza humana, com o qual justificou o pedocentrismo.

Também baseadas em Rousseau são as teorias educacionais libertárias, entre as quais se encontram os famosos e fracassados projetos escolares de Yasnaia Poliana, de Leon Tolstói, e de Summerhill, de A.S. Neill, nos quais as crianças freqüentavam as aulas quando queriam. Os projetos libertários partem do pressuposto de que qualquer autoridade é nociva ao educando; a verdadeira educação busca formar o sujeito autônomo.

Paulo Freire, no entanto, deve ser posto à parte. Embora também comprometido com a libertação, não parece tão marcado pela reação à tradição e rejeita abertamente o subjetivismo. Freire acredita que a educação precisa levar em consideração a situação sócio-política do indivíduo, e deve ter como alvo libertá-lo da opressão. Mas "... só os próprios oprimidos é que devem implementar essa ação libertadora." Assim, a "pedagogia do oprimido" é um método de conscientização no qual homem "chega a ser sujeito" refletindo sobre sua realidade histórica e articulando sua libertação. A despeito de sua inclinação autonômica, não é irrecuperavelmente autonomista.

Talvez a mais influente teoria educacional autonômica seja o construtivismo, ou cognitivismo, cuja figura principal é Jean Piaget. Na proposta construtivista o objetivo da educação "... não consistirá na transmissão de verdades, informações, demonstrações, modelos, etc., e sim em que o aluno aprenda, por si próprio, a conquistar essas verdades ..." A finalidade da educação é conduzir o aluno à autonomia intelectual, e as estratégias de ensino devem focalizar a experiência e a resolução de problemas por parte do próprio aluno. O professor funciona como um facilitador ocupando-se mais do desenvolvimento da inteligência do que da transmissão de fatos. Assim, por exemplo, Piaget acreditava que o direcionamento ético equivaleria à coação moral; o juízo moral da criança deveria ser construído de forma autônoma, por meio de experiências sociais.

O construtivismo tem sido criticado por pensadores cristãos como incompatível com o cristianismo devido à seu relativismo intrínseco e às suas consequências pedagógicas. A aplicação no Brasil dos ideais da Escola Nova e depois, do construtivismo originaram uma prática educacional marcadamente autonomista e produziram toda uma geração de indivíduos de grande pobreza ética e perspectivas relativistas. Discussões sobre valores morais, especialmente se de inspiração cristã foram banidas das salas de aula, e só nos últimos anos voltaram a ser uma preocupação dos educadores.

Embora seja perceptível na história uma tensão constante entre heteronomia e autonomia, podemos dizer que a teoria educacional na atualidade inclina-se para a autonomia desde a renascença e, principalmente, do iluminismo, seguindo a inclinação da filosofia moderna. No século vinte a degeneração da racionalidade em relativismo penetrou nas teorias educacionais, de modo que desenvolveu-se uma atitude negativa em relação à autoridade do professor e à idéia de transmissão de conteúdos. Podemos sumarizar a orientação das práticas educacionais na atualidade em poucas palavras: o educando deve ser o sujeito de sua própria educação.


3. A Teonomia como Ideal de Civilização

3.1. A Falha Ontológica do Esquema Heteronomia/Autonomia

Tanto a heteronomia como a autonomia expressam uma falha ontológica fundamental: a dificuldade de relacionar adequadamente sujeito e objeto, sendo um absorvido no outro, sempre. A causa dessa falha ontológica deve ser encontrada na forma de considerar a origem do nomos, os universais. Ao identificar as leis da realidade com o sujeito ou com o objeto, torna-se difícil relacionar um e outro, pois um deles passa a funcionar como "divindade", como explicação final do outro. Isso faz com que um seja sempre absorvido no outro.

Assim na heteronomia encontramos uma "inflação" do objeto. A inflação do objeto cria interpretações reducionistas da realidade, como se ela fosse uma variedade de manifestações de uma única essência. O naturalismo filosófico promove essa inflação/redução ao considerar realidades diversas como as leis físicas, a vida biológica, a consciência e a religião como meros produtos da matéria + tempo + acaso.

O contrário encontramos na autonomia, quando há uma "inflação" do sujeito e uma redução do objeto. A inflação do sujeito inclui a tendência de compreender a realidade de forma subjetivista, como se a ordem encontrada em nossa percepção fosse meramente um produto da própria mente (Kant), ou das convenções da linguagem. Não haveria assim uma percepção da realidade "em si". A inflação do sujeito conduz à destruição do impulso de síntese teórica e a interpretações fragmentárias da realidade. Esse quadro é exatamente o que encontramos hoje na pós-modernidade.

O subjetivismo é também, em última instância, reducionista, mas a redução é praticada em sentido inverso. Os objetos e o próprio sujeito são reduzidos a determinada função temporal do sujeito. Assim, no racionalismo iluminista, a função racional era o ponto de partida da redução, e no século XIX, a historicidade do sujeito. No desconstrucionismo, ao mesmo tempo em que se defende a liberdade do indivíduo, se dilúi este indivíduo em interpretações materialistas e psicanalíticas reducionistas.

O que o objetivismo e o sujetivismo tem em comum é uma determinada perspectiva a respeito do fundamento da realidade. Os ocidentais tem pensado, desde os gregos, que o fundamento último da realidade é o "Ser". Criou-se assim a metafísica do ser, na qual se acredita que as entidades tem essências que lhes dão seu caráter singular e determinam seu comportamento. No pensamento essencialista o nomos tem sua origem nas entidades, sendo o sentido, portanto, dependente do modo de existir das coisas.

3.2. Teonomia

Partindo de uma perspectiva cristã da realidade somos levados a uma ontologia bastante diferente. Admitimos que o fundamento último das coisas não é a existência, o "ser", mas o significado. O mundo nasceu do propósito e decreto de Deus, de modo que o ser é possibilitado pela lei de Deus. Dizemos então que o lado ôntico da realidade depende do seu lado nômico. Ora, tanto o sujeito como o objeto são entidades, e ambos funcionam a partir do nomos.

A solução cristã do dualismo objetivismo/subjetivismo é negar que os universais sejam originados do sujeito ou do objeto. Considera-se assim que o objeto não é a fonte das leis que o governam; e o sujeito, embora sendo sujeito, é também objeto não sendo fonte de nenhuma lei. Todos, sujeitos e objetos estão sob as leis, e nenhum deles é a fonte de qualquer lei.

As implicações disso são imediatas. Não sendo o sujeito a fonte das leis, ele deve descobrí-las, não construí-las. Isso torna possível que o empreendimento científico seja uma atividade comunitária e rigorosa, fundando-se na esperança de que o cosmo apresenta uma ordem fundamental que pode ser atingida pelo sujeito coletivo.

Mas desde que nenhum objeto é a fonte das leis, o homem não precisa ser reduzido a nenhum objeto da realidade; e mais: nenhuma tirania é permitida, porque o sujeito e os objetos não podem ser diminuídos e forçados dentro de um único aspecto da realidade, nem tiranizados por uma instituição social específica.

A essa nova condição denominamos Teonomia – uma situação tal em que não se admite que qualquer realidade no cosmo, humana ou não humana, seja considerada o fundamento da realidade e do sentido das coisas. Na atitude teonômica, nada é deus, para que Deus seja tudo, e tudo seja o que realmente é.

Pode-se perceber que a heteronomia e a autonomia são na realidade modalidades de religião. O problema ontológico esconde na verdade um problema mais profundo, de origem religiosa: a tentativa de encontrar o fundamento do cosmo no próprio cosmo, elegendo uma entidade temporal como ponto de transcendência e fonte do sentido final. Como diz Clouser: "... tanto o objetivismo como o subjetivismo são inaceitáveis desde que cada um pressupõe uma variedade de religião pagã por atribuir a uma parte da criação o papel de doador da lei ..." A abordagem teonômica é assumidamente religiosa, quando busca o fundamento do cosmo fora do cosmo, em Deus, apresentando o mérito de solucionar o problema filosófico da relação sujeito-objeto.

3.3. A Teonomia de Paul Tillich e a Teonomia Reformada

Precisamos aqui diferenciar nossa concepção daquela do grande teólogo da cultura, Paul Tillich. Tillich afirmou que a origem da tensão autonomia/heteronomia tinha raízes nas estruturas da própria razão, na tensão entre seu fundamento último (equivalendo ao nosso "universal") e suas estruturas próprias. Como fica claro, tanto a causa como a solução do problema estariam no próprio sujeito. Assim, a solução para a tensão – a teonomia – seria encontrada numa sujeição ao Espírito de Deus expressa numa firme orientação para a finalidade última (o sentido de auto-transcendência), mantendo-se a autonomia dos processos racionais.

O que se pode perceber é que Tillich pretende construir um ideal teonômico sem abrir mão da autonomia. Ele admite que a heteronomia é uma expressão distorcida do interesse pela preocupação última, mas não parece admitir claramente que a autonomia seja em si a distorção de alguma coisa, aceitando uma "boa" e uma "má" autonomia. Aparentemente, para ele, a heteronomia é sempre má, mas a autonomia não.

Ou seja, em Tillich a lei que o sujeito deve seguir nunca é externa; mesmo que ele seja guiado pela preocupação última, deverá sê-lo a partir de sua lei intrínseca, seu princípio racional. Esse princípio não pode sofrer nenhum tipo de limitação. É assim que, discutindo o uso do termo "heteronomia", Tillich diz que essa palavra deve ser usada "... para uma situação em que é imposta uma lei de fora, uma lei estranha (heteros nomos), a qual destrói a autonomia da atividade cultural, sua autós nomos, sua lei intrínseca. Da relação entre teonomia e heteronomia, fica óbvio que a idéia de cultura teônoma não implica em qualquer imposição a partir de fora." Evidentemente, a teonomia Tillichiana é uma variedade espiritualizada de autonomia.

Coerentemente com sua posição Tillich diviniza o sujeito, e passa à crítica do que chama de "ruptura" sujeito-objeto. Para ele a teonomia traz a libertação da "... prisão ao esquema sujeito-objeto". O que temos aqui? A tendência própria das expressões não-teonômicas de fundir o sujeito no objeto.

Falando específicamente da filosofia, mas de uma forma simples e aplicável a outras funções culturais, Tillich diz que "Uma filosofia é teônoma quando é livre de interferências externas e quando é efetivo o impacto da Presença Espiritual nos processos atuais de pensamento." Uma definição de teonomia na perspectiva reformacional seria substancialmente diferente: uma filosofia ou expressão cultural qualquer é teônoma quando é sujeita a todas as soberanias externas e livre da tirania idolátrica de uma única soberania sob o impacto da Presença Espiritual. Na situação teonômica, nunca há fusão de sujeito e objeto, mas o reconhecimento humilde do sujeito de que ele é também um objeto com os outros, e compreensão das leis de Deus que regem todos os objetos.

Essa sujeição a todas as "soberanias externas" obviamente choca-se frontalmente com Tillich e com o humanismo moderno, porque na mentalidade humanista a liberdade do homem é atingida por meio de uma superação de toda normatividade. Por essa razão, na cultura autonômica, a dinâmica religiosa profunda é expressa numa espécie de luxúria libertária, na qual a revolução e ruptura das tradições, dos valores aceitos, das estruturas contemporâneas são vistas como as portas da realização humana. Essa religião da revolução sempre em escravidão. Na posição reformacional ou teonômica, a liberdade não vem de uma superação das leis externas, mas de uma relação eugênica com essas leis. O que caracteriza a heteronomia é a relação patogênica, doentia, na qual uma lei se apodera do sujeito e impede nele a operação das outras leis.

3.4. O Ideal Teonômico de Civilização

O principal objetivo da educação cristã é contribuir para a construção de uma civilização cristã, uma expressão da Civitas Dei. Essa construção é necessária, dada a concepção bíblica do homem e de sua tarefa no mundo. O homem não é uma coleção de funções justapostas, como se cada uma pudesse existir separadamente da outra: pensamento, arte, religião, sexo; é antes um coração que tem diversas funções temporais mas que transcende a todas elas em direção a Deus. Não se pode, portanto, ser cristão em uma única dimensão da vida – a igreja – e não o ser na política, na educação, no pensamento, na arte, na cultura enfim. O homem só pode ser cristão em seu núcleo, e se assim o for, assim o será em todas as suas funções temporais. Isso coloca, obviamente, o cristianismo bíblico numa situação antitética em relação à cultura ocidental, pois ao contrário do que esta hoje acredita sobre a religião – que ela deve ser uma questão de "foro íntimo" – o cristão se torna autêntico quando se torna um formador de cultura, quando molda seu meio para operar nele de forma que Deus seja glorificado; enfim, quando escuta de novo o mandamento de Deus no Éden: "enchei a terra, e sujeitai-a".

Ou seja, o cristianismo não pode existir somente como uma igreja institucional, ou como um sistema doutrinário, ou como uma experiência mística, mas como um Weltanschauung, um "sistema de vida", segundo expôs Abraham Kuyper, o qual está hoje em combate mortal com paganismo ocidental, e cujo princípio deve ser erguido antitéticamente contra o princípio pagão: "... no Modernismo, a imensa energia de um abrangente sistema de vida nos ataca; depois também, deve ser entendido que temos de assumir nossa posição em um sistema de vida de poder, igualmente abrangente e estenso." Ou seja, precisamos edificar a Civitas Dei, a cultura teonômica.

Mas como o homem grego nascia de uma educação voltada para a participação e construção da polis, os cristãos edificarão a sua polis formando o indivíduo para ser um determinado tipo de homem. Esse homem não é nem o hebreu nem o grego, mas o Novo Homem, o kainòs ánthropos. É verdade que tal homem é criado por Deus, em Cristo (Ef 4.24; Cl 2.10,11); mas sua expressão histórica é mediada pelo discipulado cristão, de modo que o indicativo divino se realiza em e por meio da obediência ao imperativo "revesti-vos do novo homem", imperativo este dado no processo educacional (cf. Ef 4.20-24).

O homem cristão é um homem-sinal, não sendo mais o velho homem, mas também não sendo ainda totalmente novo; ele vive entre os tempos, participando simultaneamente da velha e da nova criação, mas sinalizando historicamente a aproximação irreversível do novo. Desse modo o projeto de uma cultura teonômica não é um projeto utópico, pois só Deus introduzirá de forma definitiva o reino. Trata-se de um projeto histórico, de um modo de existir antitético dentro da história, no meio desse mundo velho, canalizando os benefícios da graça para esse mundo de uma forma integral, mas mantendo-se em luta renhida e sem descanso. Trata-se simplesmente de ser cristão de forma coerente, integral e corporal.

4. O Ideal Teonômico e a Educação Cristã

4.1. Consequências Pedagógicas da Heteronomia e da Autonomia

No balanço final, tanto a heteronomia como a autonomia conduzem à destruição do espírito investigativo. A heteronomia produz esse efeito pela depressão do juízo crítico. Nessa depressão a capacidade de diferenciação é minada e a diakrisis impedida pela redução dogmática de toda a realidade a um único aspecto da realidade. Os professores cristãos conhecem bem a dificuldade de raciocinar de forma "aberta" ou "multi-aspectual" encontrada em jovens de formação naturalística; estes manifestam a tendência dar explicações simplistas para todos os fatos humanos que encontram – morais, religiosos, sociais -, geralmente supondo que tal abordagem dogmática e unilateral é científica. Esse é um estado evidente de tiranização da consciência. O mesmo efeito é encontrado em alunos com rígida formação religiosa fundamentalista, que foram ensinados a converter explicações teológicas da realidade em explicações científicas.

A autonomia, ao contrário do que se pensa, não favorece realmente o espírito científico. Ela mina a investigação pela inflamação do juízo crítico. A inflamação ocorre quando educando ergue sua razão ilegitimamente a um ponto de transcendência e leva a diakrisis à situação patológica de não admitir nenhum nomos exterior a si mesmo. Nesse momento ocorre uma ruptura do sujeito com a realidade e uma perda da confiança em suas possibilidades de encontrar explicações globais e verdadeiras da realidade. Essa perda da confiança pode não ser imediata; o racionalismo do século XVII era otimista sobre os efeitos da autonomia da razão; os pensadores do iluminismo, ainda mais. Entretanto, hoje estamos colhendo os frutos da modernidade: ceticismo, relativismo, niilismo. Aparentemente os jovens de hoje, ao atingir esse ponto crítico passam rapidamente da confiança na razão para um ceticismo radical, muitas vezes com desinteresse intelectual.

O ponto é que a realidade é tanto complexa como simples, una e múltipla. A heteronomia não é capaz de lidar com a realidade múltipla porque busca uma unidade essencial de forma reducionista, manifestando assim um fechamento para a complexidade, e a autonomia não é capaz de lidar com a unidade da realidade, porque não pode reconhecer a existência objetiva de universais fora de sua própria razão, manifestando um fechamento para a unidade e uma tendência de fragmentação.

A autonomia e a heteronomia também produzem consequências éticas. A heteronomia desfavorece a maturidade moral e torna o indivíduo legalista, na medida em que a internalização da lei pelo sujeito não é essencial. A autonomia desestimula a transmissão de valores e relativiza a concepção cristã do homem. F. Solano Portela criticou de forma precisa e esclarecedora o construtivismo, dando um enfoque especial ao seu relativismo moral.

Consequências sócio-políticas também acontecem. De um modo geral, a educação autonômica tende a enfatizar a liberdade do sujeito em relação aos mecanismos educacionais de alienação Assim, na educação liberal o indivíduo é ensinado a resistir a toda e qualquer negação de sua liberdade individual; essa ênfase unilateral na autonomia gera o individualismo e favorece o estado liberal não intervencionista e o capitalismo laisses-faire. A crítica de Althusser ao reprodutivismo e os insights das pedagogias libertárias mostram que a escola não existe em isolamento; ela faz parte de uma estrutura e seu programa educacional é o programa das elites. Na pedagogia de Paulo Freire, o indivíduo oprimido é conscientizado para se tornar um agente da própria libertação histórica.

Na educação heteronômica a consciência política pode não estar totalmente ausente, mas em existindo, será marcada pela devoção dogmática a uma determinada instituição programa utópico. A política marxista é assim coletivista e absolutista, e o indivíduo fica totalmente submerso nos interesses do estado.

4.2. Teonomia e Construção do Sujeito

Uma perspectiva importante do pensamento reformacional é a idéia de que, entre si, e em relação a Deus, todas as entidades são tanto sujeitos como objetos. Existir, então, é ser sujeito, no sentido de ser sujeito da ação e também de ser sujeito à ação. O que capacita uma entidade a funcionar como sujeito ou objeto é sempre o nomos.

Pensando a atividade educacional dessa forma, percebemos que todo o debate da autonomia contra a heteronomia está desencaminhado porque se ignora um fato básico: o educando não é somente o sujeito de sua própria educação, mas também um objeto ou um "sujeito-a" na educação. Isso porque a educação é uma atividade civilizatória. A educação é, sempre, uma ação de certa comunidade sobre seus novos membros, não havendo educação que não pressuponha um projeto civilizatório. Essa é uma contribuição importante de Durkheim: a função da educação é socializar o indivíduo inculcando-lhe os valores sociais e fortalecendo a integração cultural. Mesmo a tentativa de criar uma autonomia plena no educando não pode passar de ser uma tentativa de impôr um ideal de civilização sobre os indivíduos – e nesse momento, negar que o indivíduo está sendo tratado como objeto torna-se uma tolice.

Para os autonomistas, falar do indivíduo como "sujeito-a" pode parecer absolutamente assustador – não obstante, é a realidade. Mas não se deve ver isso como um problema. Não há sujeito humano sem cultura e comunidade. Não pode haver sujeito livre sem civilização. O funcionamento do indivíduo como sujeito depende totalmente de sua operação adequada como objeto, porque é a própria sociedade quem toma o indivíduo-objeto para criar nele o sujeito. Dessa forma, o indivíduo nunca é sozinho o sujeito de sua educação; ele é sujeito na medida em que é objeto de uma atividade pedagógica comunitária.

Não faz sentido, portanto, tentar formar por meio do processo educacional indivíduos de consciência autonômica ou heteronômica. O indivíduo de consciência autonômica é um fator de ruptura, de revolução, e a revolução é sempre destrutiva para a civilização, porque sempre envolve uma condenação absoluta das estruturas culturais. Essa condenação absoluta não faz jus ao fato de que há normas divinas que determinam, em maior ou menor grau, a organização de determinada cultura, e trata a sociedade erroneamente, como ela se fosse meramente um produto arbitrário da vontade humana. A transformação de um educando em um autonômico é o rompimento do processo educacional e a introdução de uma anomia social. O projeto autonômico pode gerar apenas rupturas sociais e fragmentação cultural.

Quanto à consciência heteronômica, esta torna a cultura estagnada, destruindo seus fatores internos de renovação e purificação, que são os sujeitos livres. Além disso a heteronomia sempre acaba produzindo, em reação, a autonomia. A consciência teonômica não é conservadorista; embora reconheça as leis divinas estruturando a vida humana, reconhece também a influência pervasiva do pecado em toda a ordem criada. Assim, ela exige a reforma de toda a existência a partir do evangelho.

4.3. Teonomia e Educação

A abordagem teonômica é a abordagem apropriada a uma educação cristã porque não é nem reprodutivista nem de ruptura. Essa abordagem é capaz de manter o valor básico da heteronomia – a exigência de manter o sujeito como um objeto, alguém que nunca tem liberdade absoluta devendo se sujeitar a todas as leis que regem os objetos. Essa atitude traz ao sujeito o respeito pela tradição, pela pesquisa científica, e um interesse por toda a realidade, uma verdadeira abertura para a complexidade. Essa atitude (1) protege o educando de cair no subjetivismo relativista, na medida em que inculca nele a consciência das leis que regem a realidade; (2) instila o respeito por essas leis como fatos da realidade que precisam ser entendidos e respeitados, não invenções sociais; (3) protege o educando da anarquia tornando-o útil e bem integrado à sociedade.

Por outro lado, o valor básico da autonomia também é mantido: é somente funcionando como sujeito que transcende os objetos que o homem poderá de fato compreender os objetos. O reconhecimento da unidade profunda da realidade mantém no educando a abertura à unidade, e conseqüentemente o guarda da fragmentação relativista da realidade. O sujeito teonômico está atento à toda a realidade, respeitando a multiplicidade das coisas, reconhecendo todas as instituições sociais, mas recusando-se resolutamente a ser tiranizado por um aspecto da realidade, ou ser reduzido a um único aspecto da realidade. Enquanto o autonômico é "livre" recusando toda a autoridade, o teonômico é livre recusando a tirania de uma única autoridade.

Isso dá ao educando uma atitude crítica. Ele é formado para discernir todo dogmatismo idólatra, não meramente em sua caracterização teológica, mas em suas múltiplas manifestações. Por exemplo, na perspectiva do conhecimento e da política: De que forma essa leitura da realidade está distorcendo a realidade a favor de uma única perspectiva? De que forma essa leitura da realidade está favorecendo um projeto tirânico?

Mas o ponto fundamental é que o educando mantém sua atitude funcional como sujeito não autônomo e objeto não heterônomo adorando ao Deus vivo e reconhecendo nele a fonte de toda a realidade, de toda lei e de todo sentido. A adoração a Deus é a força que mantém em equilíbrio a atitude crítica em relação à heteronomia e a atitude positiva em relação às leis que Deus instituiu.

Continua...

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